A Modista do Desterro – Pauline Kisner

Um Robe a l’Anglaise 1760 para chamar de meu

Eu tinha um sonho e esse sonho se chamava Robe a l’Anglaise.

Um dos estilos mais lindos do século 18, com suas costas ajustadas e volumes mais práticos para o dia-a-dia, o Robe a l’Anglaise me seduzia há anos. Uns cinco ou seis anos atrás, comprei um tecido sintético com estampa adamascada num tom de rosa muito delicado. Era um tecido de cortina/estofamento e estava em promoção (porque eu sou a louca das promoções MESMO) e comprei logo 4m com 3m de largura. O plano original era fazer um vestido de baile vitoriano, até que “ele” apareceu pra mim no Pinterest:

robe a l'langlaise round gown
Robe a l’anglaise em seda carmesim do FITMuseum

E, embora o modelo que me inspirou seja vermelho, exemplos semelhantes em rosa não faltam. O rosa foi uma cor muito popular no século 18, usado tanto por homens quanto por mulheres, e em diferentes tons. Muito antes de ser considerado uma cor “feminina” ou “delicada”, ele era visto como uma cor…sexy! Rosa definitivamente não faz parte da minha paleta de cores favoritas, mas dessa vez resolvi abrir uma exceção com uma única condição: eu usaria rosa, mas “quebrado” com alguma outra cor junto.

Durante a pesquisa acabei descobrindo que o rosa era frequentemente usado com duas cores: branco e azul. Como o branco acabaria sumindo por conta do tamanho da estampa, considerei o azul como uma boa opção e comecei a procurar algumas referências. Na hora em que encontrei esse quadro num leilão de antiguidades, eu já sabia o que queria fazer:

Retrato de uma desconhecida inglesa nos anos 1750-1760.

As temidas costas do Robe a l’Anglaise

A característica mais distinta do Robe a l’Anglaise são as costas ajustadas, em contraste com as pregas ondulantes do Robe a la Française:

Mas essa também é a parte mais intimidante do vestido, já que essas costas maravilhosas precisam ser feitas diretamente no corpo, em cima de um forro já ajustado direitinho no tronco da pessoa. Toda a minha modelagem foi resultado de uma combinação explosiva entre moldes do livro Patterns of Fashion, instruções do Guia de Costura Histórica da American Duchess e um excelente tutorial do blog The Fashionable Past.

Molde de referência do excelente Patterns of Fashion.

As costas também foram a parte que mais consumiu tempo no projeto todo, já que elas precisaram ser pregueadas e alfinetadas várias e várias vezes até chegar ao resultado que eu mais ou menos esperava.

robe a l'anglaise costas
Ninguém disse que era fácil… Mas ainda quero fazer um tutorial desse bichinho para vocês!

Com as pregas alfinetadas:

E tudo costuradinho (à máquina!) no lugar:

Como eu queria opções diferentes com o mesmo vestido, resolvi incluir um pequeno truque para poder franzir as costas e criar um efeito puff: dois botões e duas alças de fita de cetim:

Depois percebi que poderia fazer as alças de um tom diferente para que elas aparecessem mais.

Cuidando da frente do bebê

Depois das costas costuradas, todo o resto do vestido foi um passeio no parque. Como o Robe a l’Anglaise era um traje versátil e considerado até informal, as possibilidades de fechamento e decoração eram imensas. Para decorar, optei por algo mais simples, na linha das decorações que a gente vê em peças de museus. Usando uma fita de cetim nº 9 numa cor próxima à do vestido, criei uma aplicação franzida e costurada à mão, o que me permite até trocar quando eu quiser mudar o visual do traje. Para fechar o vestido,optei por um stomacher, o que me dá liberdade tanto de trocar o painel central da frente, quanto me permite regular o vestido em um manequim para cima ou para baixo:

O broche é um detalhe historicamente correto que ajuda a “preencher” um stomacher sem maiores decorações.

O detalhe que eu mais gosto desse stomacher é como ele é colocado no vestido. Pela primeira vez, consegui fazer um vestido século 18 que é totalmente alfinetado:

Se você olhar com atenção, consegue ver os alfinetes escondidos na decoração. Eles correm entre as camadas do corset e ficam bem firmes, sem me machucar!

Um outro detalhe que fiz questão de incluir foi a abertura dos bolsos internos que ficam embaixo da saia, e a saia tem uma abertura na mesma posição. Cabe chave, celular, cartão de banco, uma maravilha!

Uma outra função para essa abertura é usar o vestido retrousée dans les pouches, ou seja, puxando a pontinha da frente por dentro da abertura:

Esse modo retrousée era mais popular nos anos 1780 e vai muito bem quando a parte de trás está franzida com as alcinhas^^

Robe a l’Anglaise: versão tradicional

A versão tradicional (e original) do Robe a l’Anglaise é solto por cima de uma saia pregueada, que pode ou não ser feito do mesmo tecido que o restante do vestido. Optei por fazer a saia num tom de azul bem contrastante, o que criou um efeito interessante:

Soltinho no corpo, ele cobre toda a parte de trás da saia e enfatiza o desenho elegante das costas e o bumbum redondinho e avantajado:

I’m bringing booty baaack

E tem um movimento bem bonito também:

Robe a l’Anglaise en polonaise

Uma outra forma bem popular de se usar o Robe a l’Anglaise era en polonaise, ou seja, à polonesa. O século 18 tem vários vestidos com nomes estranhos que fazem referências a povos e nações, mas que têm pouco ou nada a ver com os estilos realmente usados nas regiões. O estilo à polonesa era um desses casos, que consistia em suspender a parte de trás da saia com alças, criando três “gomos” nas costas. Como eu sou apaixonada pelo estilo, resolvi fazer uma modificação pequena para poder usar o vestido também en polonaise:

Me sentindo numa pintura de Fragonard, hahahahahaaa

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