A Modista do Desterro – Pauline Kisner

Oito anos de costura histórica: o que mudou?

Parece mentira, mas em agosto desse ano faço 8 anos de Sociedade Histórica Destherrense e, consequentemente, de aventuras na costura histórica. Um dia desses, no Instagram, a Luiza desafiou a mim e à Ju Lopes para fazermos uma comparação entre nossos primeiros trajes e os atuais. Assim, vamos lá comprovar que (com a graça de Deus) todo pokémon evolui!

“VICTORIAN GOTH”: 2010 X 2017

O primeiro traje não foi exatamente um traje. Ele foi mais uma sobreposição de elementos mesmo, do tempo em que eu ainda não tinha me convencido de que, se eu queria qualidade, precisava aprender a costurar.

Em 2010, temos a camisa Tim Burtonesca-transparente-que me afogava em babados e uma saia linda de tafetá flocado feita pela Mamys, mas que estava curta demais na frente. Foi meu primeiro traje para meu primeiro evento e eu honestamente não tinha a menor ideia do que estava fazendo, hahahaha.

PORÉM

Eu amo essa saia justamente porque ela está aqui para me lembrar que já houve um tempo em que eu precisei fazer um esforço absurdo para levar um projeto até o fim. Tenho um carinho muito grande por ela, tanto que, em 2017, ela acabou passando a fazer parte do traje da D. Mathilda Augusta, minha persona de uma viúva dos anos 1890. A Mathilda Augusta também foi meu primeiro flerte com os anos 1890 e está bem aquém do que eu gostaria que fosse – tanto que ela está indo para reforma este mês. A saia, essa vai ficar no baú das memórias, bem protegida.

O que você manteria/manteve: a saia preta e a sombrinha de cetim italiano com franjas de seda, que foi um achado.

O que você descartaria: a camisa, que não serve para um traje histórico de jeito algum. Mas ela fica super bem com blazer e calça social 😉

“TRAJE PASSEIO 1910”: 2013 x 2015 x 2016

Eu tenho um problema com saias de passeio, isso é visível. Tenho umas quatro saias dessas de 5 e 8 painéis, só porque elas são ótimas de usar no inverno aqui do sul… Mas vamos aos trajes!

Montando essa foto acabei de perceber que faz mais de um ano que não visto um traje eduardiano. Bateu saudade…

A saia de passeio em cinco painéis foi a primeira peça de costura histórica que eu aprendi a fazer do modo autêntico, ou seja, a partir de um molde original e com técnicas originais. Tanto a saia rosa (2013) quanto a saia azul (2015) já foram reformadas depois disso, tanto para descer a barra quanto para ajustar a cintura ou refazer pregas.

O que você manteria/manteve: a saia azul e a saia roxa têm um bom caimento, embora eu goste mais da roxa porque ela tem espaço para anágua engomada; a camisa do conjunto roxo é um modelo da Renner que foi um achado e tanto (comprei pra usar no trabalho e depois achei um modelo quase igual num museu)

O que você descartaria: a blusa da primeira e segunda fotos. Ela é bonitinha, mas foi feita no tecido errado e não tem o caimento correto.

O CUPCAKE : 2011 x 2015 x 2017

Nossa.Mãe.Do.Céu.exe

Em 2011 eu tinha acabado de comprar minha primeira crinolina da China (cujos aros ainda fazem parte da crinolina atual!) e queria muito um “vestido armado”. Com toda a boa vontade, minha mãe juntou todo o conhecimento dela sobre vestidos de prenda e fez o vestido bege e rosa da primeira foto. Foi a última roupa que ela costurou pra mim e, assim como a saia preta lá de cima, é uma peça que guardei com muito carinho até recentemente. A gente não tinha a mínima ideia de como era uma crinolina, um corpete vitoriano ou uma saia para a bendita armação. Mas lembro desse dia com carinho duplo: primeiro pelo vestido, segundo porque foi o dia do primeiro passeio guiado da Sociedade Histórica Destherrense – e eu nem fazia ideia de que o hobby viraria profissão.

Em 2015 eu já tinha feito uma crinolina do tipo cage com 6 aros, mas ela ainda não estava com as proporções corretas: o primeiro aro estava muito baixo, criando uma silhueta abajur, e a crinolina era muito comprida para o tamanho da saia. Mas foi meu primeiro corpete vitoriano, baseado em um molde do livro da Janet Arnold, e o primeiro feito com toda a técnica da época, do forro à aplicação das barbatanas e decorações. A saia já não existe mais, mas o corpete está no armário de figurinos para me lembrar que o esforço compensa.

O que você manteria/manteve: a renda do primeiro vestido. Só recentemente resolvi desapegar dele e, como era feito de oxford, não valia a pena guardar o vestido, só a renda mesmo. A crinolina da segunda foto foi reformada e hoje está quase como eu quero.

O que você descartaria: o tecido do primeiro vestido (oxford).

Eu disse que os pokémons evoluem!

SÉCULO 18: 2017 x 2018

Século 18 é um território novo e excitante para mim. Depois de 7 anos só pesquisando Era Vitoriana, confesso que já estava ficando meio entediada e o século 18 veio como um alívio e um estímulo. A modelagem é completamente diferente, assim como as técnicas de costura, o que significa um mundo novo de pesquisas e um novo fôlego nos projetos. A vantagem é que cheguei no “novo século” com 7 anos de experiências e testes e consigo produzir um traje século 18 muito mais rápido do que faria com um vitoriano, no começo da minha “carreira” (cof cof). Do primeiro para o segundo traje, a técnica deu um salto: de um bedgown simples e uma anágua torta, já passei para um shortgown aceitável, forrado e sem grandes erros perceptíveis (mas tem vários ainda!).

Foram bons oito anos até aqui.

O QUE EU APRENDI ATÉ AGORA?

Gente, mais coisa do que eu jamais pensei que aprenderia, tanto de costura quanto de história social da moda em si. Aliás, se alguém lá em 2008, quando em me formei em História, me dissesse que eu não só pesquisaria história da moda, como abriria um campo de trabalho novo na minha área com a living history, eu certamente seguraria o riso.

Os conhecimentos mais valiosos até agora? Vamos lá:

  • Buscar acuracidade histórica é legal, mas não dá pra ficar amarrado com ela. Chega uma hora que a gente precisa ceder em alguma coisa pela nossa sanidade e isso é perfeitamente aceitável.
  • Espelhar-se na galera de ponta da costura história (Prior Attire, American Duchess, The Dreamstress, Before the Automobile, Angela Clayton) é bom e te dá referencial de qualidade, mas para cada uma delas, com os recursos financeiros e de pesquisa que elas têm, existem umas 50 de nós fazendo o nosso melhor com muito menos – e isso precisa ser mostrado.
  • Eu entendi porque os moldes vitorianos são cheios de curva e porque eles precisam ser ajustados no corpo. Isso faz toda a diferença;
  • Um bom corset adequado ao período que você está recriando faz maravilhas. A falta dele destrói o traje mais perfeito;
  • O molde de teste (mockup/toile) é meu melhor amigo. Cortar o teste em algodão mais grossinho, fazer correções, cortar o tecido mais caro por ele e usar o mockup de forro me poupou de muitos problemas;
  • Meça 10x, corte 1.
  • Manter minhas referências visuais organizadas;
  • Não ter medo/vergonha de pedir ajuda ou opinião do pessoal mais experiente. A maioria das gringas da costura histórica são gente boa e ajudam os iniciantes sem objeções;
  • Um kit nunca está finalizado.
  • Não ter pressa de fazer as coisas e não costurar quando estiver ansiosa ou irritada.
  • Se não for divertido, não faça.

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Uma resposta

  1. Pauline, conheci seu site por meio do canal da Eneida Queiroz e do projeto Traje Brasilis…. Estou amando ler seus textos e acho essas roupas maravilhosas. Queria que tivesse moldes pra barbie (já faço roupas de crochê pra elas mas queria uns vestidos de época também rs). Estou pesquisando moldes pra brincar com isso 🙂

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