No último artigo sobre o luto vitoriano, falei rapidamente sobre a existência de um tipo específico de jóias, os mementos, que seriam próprias para as viúvas. Como fiquei devendo falar mais sobre elas, o artigo de hoje será sobre isso.
Os mementos ou jóias de sentimento não são uma invenção da Era Vitoriana. Nós temos registros arqueológicos desse tipo de joalheria desde a Roma Antiga, mas foi a partir do Renascimento que a prática ganhou força. Na Era Vitoriana, junto com todas as coisas relacionadas ao luto, os mementos se tornaram uma indústria muito lucrativa!
No caso das viúvas vitorianas, os mementos eram o único tipo de jóias aceitáveis durante boa parte do luto. Durante o período de luto fechado, elas eram feitas em azeviche, uma pedra de origem vulcânica que é totalmente fosca; nas fases seguintes do luto, ônix e esmalte começavam a ser introduzidas, junto com armações metálicas. Alguns joalheiros ofereciam também “jóias personalizadas”, que poderiam conter retratos dos falecidos, gravações com seus nomes, mechas de seus cabelos e – pasmem! – poderiam ser feitas a partir dos cabelos daqueles que haviam nos deixado.
Hairwork
Os britânicos chamavam de hairwork a arte de transformar cabelos em intricadas jóias. Este era um trabalho muito valorizado e utilizado não apenas para as jóias do luto vitoriano, mas para outros tipos de jóias. Mas por que usar cabelo para fazer jóias? O cabelo se mantém intacto após a morte, tornando-se um símbolo da imortalidade da própria alma e da memória dos falecidos.
Mas nem sempre o próprio falecido contribuía com seus cabelos para tais peças. Havia um próspero comércio de cabelo humano, tanto importado quanto aquele que era comprado de mulheres pobres. Não raras vezes, era possível comprar este tipo de jóias por catálogos e solicitar à fábrica que incluísse as iniciais do falecido na peça:
Uma opção menos, digamos, extravagante consistia em reservar algumas mechas de cabelo do falecido para guardar em um relicário. A depender da habilidade do artesão empregado, belíssimos desenhos eram feitos com os fios:
Joias negras
Durante as duas primeiras fases do luto vitoriano, muitas mulheres tinham no azeviche a matéria ideal para suas jóias, junto com a guta percha, o ônix, a vulcanite e o esmalte. Usava-se também o azeviche francês (uma espécie de vidro tingido de preto, na verdade). A facilidade de aquisição das peças prontas através de catálogos tornou as jóias de luto (e suas imitações) muito populares:
Desde o primeiro estágio do luto vitoriano, a cor preta acompanhava a dama, aos poucos cedendo lugar a outras tonalidades. Quando em luto profundo, uma senhora de respeito usaria todas os adornos negros ou simplesmente não os usaria. Começava-se pelos alfinetes usados para prender o chapéu e o véu:
A partir de 1865, os pentes ressurgiram como adornos de cabelo e uma das poucas formas de enfeitar-se admitida às viúvas, desde que obedecendo aos materiais permitidos. Eu sou apaixonada por esse pente francês em azeviche, dos anos 1880:
Uma forma bastante aceitável e elegante de guardar a memória dos mortos eram os anéis com retratos, que poderiam ser pintados à mão ou uma fotografia em miniatura, como esta peça que pertenceu à Rainha Vitória:
Outra peça bastante favorecida pelas senhoras elegantes eram os broches, desde os modelos mais discretos até os mais luxuosos, como este usado por Mary Todd Lincoln após o assassinato do marido:
A simbologia das joias no Luto Vitoriano
Os vitorianos adoravam símbolos. Eles acabavam formando um sistema de comunização à parte dentro da sociedade, uma forma de linguagem codificada e silenciosa que era mais ou menos conhecida por todos. E, claro, isso chegou ao luto vitoriano.
Os crucifixos eram particularmente favorecidos por mulheres de todas as idades e posições sociais. Simbolizava a fé cristã e a crença na imortalidade da alma e na ressurreição. As pérolas, por sua vez, simbolizavam as lágrimas e eram frequentemente utilizados pelas mães como símbolos das almas dos seus pequeninos, que velavam por elas do Além.
As mãos cruzadas representavam a amizade, a fé e a cumplicidade. Também simbolizavam o amor em sua forma mais verdadeira e duradoura. Esse símbolo aparecia não apenas em broches e pulseiras, mas também em cintos, especialmente nos anos 1890.
Os miosótis traduziam o desejo das almas que partiam de não serem esquecidas pelos vivos.
As borboletas representavam a alma que partia em direção aos Céus.
Junto com os crucifixos, as caveiras são um símbolo muito antigo na arte cristã. As caveiras são parte fundamental em pinturas com o tema memento mori (“lembra-te de que morrerás). Na joalheria de luto vitoriano, reforçavam a ideia de que a morte é o fim de todos os homens, não importa sua posição ou riqueza.
De acordo com a tradição oral, salgueiro-chorão ou salso-chorão era uma árvore plantada junto aos túmulos para marcar a terra que não deveria ser pisada. Os antigos romanos carregavam seus galhos em sinal de respeito pelos mortos. Seus galhos pendentes eram um símbolo da tristeza e havia a ideia de que eles se curvavam sobre os túmulos exatamente como os vivos que choravam por seus mortos.
As pombas simbolizavam o Espírito Santo, mas também a paz, o amor e a fidelidade.
As bolotas, este curioso fruto produzido pelo carvalho, eram muito favorecidas nos brincos, aparecendo sempre individualmente ou em trios. Delas, diziam que simbolizava a força necessário à família para superar a separação.
O olho do amante, evocando as lembranças da pessoa amada que partira. Quando envolto em nuvens, simbolizava que a esperança de que o amado estivesse a zelar pela pessoa dos Céus
Outros motivos apareciam ao gosto da mulher. As tochas invertidas, que nos lembravam de como a vida é curta; as colunas partidas, que falavam das vidas interrompidas precocemente;. a combinação do crucifixo, âncora e coração, signos de fé, esperança e caridade; a serpente, simbolizando o renascimento, a imortalidade da vida e o amor eterno entre duas pessoas.
Saiba mais
Um dos melhores locais de pesquisa para quem curte essa área da arte e joalheria relacionadas ao luto é o site Art of Mourning. O editor/curador do site é Hayden Peters, um historiador especializado em joalheria e fascinado não só pelo luto vitoriano, mas pelo luto de forma geral. O site reúne peças de colecionadores de todo o mundo e preciosos artigos analisando as peças e os costumes de cada época.