No post anterior, falamos sobre a Primeira Era Bustle (1869-1876), quando as anquinhas traseiras viraram febre na moda vitoriana, para logo depois cederem espaço à Era da Forma Natural (1877-1882).
Após atingir seu auge em 1875, as saias começaram a diminuir no ano seguinte, deixando uma grande sobra de tecido na parte de trás que precisava ser utilizada de alguma maneira. Foi dos arranjos desse excesso de tecido que surgiu uma nova silhueta, a Forma Natural, que reinou por um curto período de tempo.
Em 1876, o bustle metálico já estava saindo de moda e dando espaço a vários estilos menores de armações. Almofadinhas (bustle pads) como esta inglesa de 1875-1876…
Ou como esse bustle pad pregueado, com fita de crinol, de 1878:
Com as anquinhas saindo de cena, a nova silhueta pedia por um bumbum levemente arredondado, mas sem os volumes típicos dos anos anteriores. Algo mais próximo da silhueta natural do corpo humano, o que acaba fazendo com que muita gente pense que a Era da Forma Natural não tinha peças de suporte. Mas as peças de suporte estavam lá, criando as linhas perfeitamente arredondadas com almofadinhas e dando suporte às imensas caudas drapeadas com estranho tipo de crinolina muito próprio dessa época:
Ou esta curiosa variante de uma anquinha:
Mas por que estas peças de suporte ainda eram necessárias? Porque todo o volume que um dia estivera nas anquinhas passou a ser complicadamente drapeado nas costas e deu origem a caudas longas e pesadas. Até os vestidos de passeio da Forma Natural tinham caudas!
De uma forma geral, a Era da Forma Natural é marcada pelo alongamento da silhueta e por uma ênfase na proporção de ampulheta. Sem os volumes laterais que até então ajudavam a afinar a cintura por uma ilusão de óptica, isso acaba levando a uma mudança na modelagem do corset. Acompanhando as mudanças na estrutura das roupas, o corset se torna mais longo, com maior compressão na área da cintura e com um novo tipo de fecho. Esse novo fecho, chamado de spoon busk, tinha um formato de colher na ponta de baixo e era levemente curvado para dentro. Isso era necessário para segurar um pouco o volume do abdômen inferior, já que os corpetes da Forma Natural foram se tornando cada vez mais longos e ajustados aos quadris.
O corpete cuirasse que surgiu na Primeira Era Bustle foi se tornando cada vez mais longo, mas também perdeu grande parte das decorações extravagantes do período anterior:
À medida em que o cuirasse se tornava mais longo, as pences não eram mais o suficiente para garantir o ajuste correto da peça. Começaram a surgir então os recortes do ombro até a barra, seguindo as linhas do corpo feminino de um modo muito parecido com o dos tubinhos atuais. Seguindo a tendência de verticalidade, os corpetes com esses recortes eram tão longos a ponto de terem quase o mesmo comprimento do vestido ou até se tornaram uma peça única:
Aliás, o vestido aí em cima traz um detalhe que é quase uma “assinatura” das saias do período da Forma Natural: assimetria. Quando as mulheres vestiam combinações de corpete e saia separados, a regra era que a decoração ficasse quase que toda na saia. O avental/apron da Primeira Era Bustle se tornou ainda mais longo, sendo drapeado em diversos desenhos extremamente elaborados, que entravam e saíam de moda várias vezes ao ano. Para manter a frente ajustada ao corpo, muitas saias tinham cordões pelo lado de dentro, que eram amarrados ao redor das pernas!
O modelo de saia mais famoso da Forma Natural foi a fan skirt, uma saia que descia ajustada da cintura até os joelhos e então sua parte traseira se abria numa lindíssima forma de leque:
Mas muitas mulheres usavam um combinação de saia e sobressaia. A foundation skirt, ou saia propriamente dita, era um modelo coringa com muitas pregas traseiras, que poderiam ser arranjados de diversas maneiras por meio de cordões e até alfinetes. A sobressaia podia ser combinada com uma cauda removível, que criava o efeito de uma verdadeira cascata de tecido atrás da mulher:
Para dar conta de sustentar e proteger essas saias, as anáguas também começam a ganhar cauda. Uma das invenções mais interessantes desse período é a balayeuse, uma cauda removível que podia ser acoplada à sua anágua favorita para dar suporte à saia e proteger a cauda do atrito direto com o chão:
Por volta de 1880, as saias começaram a perder a cauda (exceto para ocasiões formais) e se tornaram cada vez mais ajustadas ao corpo, o que atraía críticas dos mais conservadores por ser uma moda indecente. Sob uma certa influência do século 18, um novo estilo de drapeado aparece: as “dobras paniers”, que lembravam muito de leve as anquinhas laterais dos anos 1700:
Ao mesmo tempo em que as saias ficavam mais sequinhas, as sobressaias começaram a sair de moda. A novidade eram as saias inteiramente decoradas com babados e laços. Por volta de 1881, os decotes começaram a subir e fechar. Mesmo nos vestidos de baile, os ombros de fora perderam espaço para decotes quadrados, decorados com renda e algumas vezes até fechados com uma chemisette de tecido semitransparente. Durante o dia, os decotes eram preenchidos com golas e lenços. Em 1882, as várias camadas de babados das saias começam a diminuir até quase desaparecer, anunciando a chegada de um novo estilo da moda vitoriana feminina: a Segunda Era Bustle, assunto do nosso próximo artigo 😉