A Modista do Desterro – Pauline Kisner

A Arte de Agradar: 8 conselhos de etiqueta vitoriana para os dias de hoje

Em 1854, circulou no Rio de Janeiro um jornal direcionado ao público feminino, chamado “Novo Correio das Modas”. Era praticamente a versão vitoriana de um canal de feminices: falava-se de moda francesa, dos eventos sociais da cidade, comentava-se a toilette que as elegantes cariocas usavam na ópera e nos bailes, publicava-se literatura e, como não poderia deixar de ser, falava-se de etiqueta.

O texto a seguir é um trecho de um dos artigos do número de estreia do jornal, intitulado “Philosophia da Vida Social ou Arte de Agradar”: um breve manual dos princípios básicos da etiqueta, organizados em oito conselhos que, segundo o autor, resumiam a boa educação e seriam suficientes para quem quisesse fazer bonito nos salões da Corte. Por questão de charme, mantive a grafia original; as ilustrações são por minha conta e não fazem parte da publicação original.

8 conselhos de etiqueta vitoriana:

“Too Early” (1873), de James Tissot.

1º  – O mais seguro meio de figurar na sociedade é mostrar-nos verídicos e modestos em nossas relações com os outros.

2º – Quem quizer ser acatado e estimado, receber louvores e cumprimentos, necessita tratar de os merecer, procurando continuamente aperfeiçoar-se. A verdadeira perfeição que deve ser o fim de nossos esforços perseverantes, é a virtude. Com ella seremos indulgentes para com a fraqueza de nossos semelhantes, e jamais descobriremos suas faltas e seus erros para brilharmos á sua custa.

“Arrufos” (1887), Belmiro de Almeida

3º- Sêde bem reservado e moderado nas manifestações de vossos pezares ou alegrias. A impaciencia muito trivial de confiar á primeira pessoa que se encontra a propria felicidade ou desventura, é uma fraqueza da alma que nada consegue de bem e póde ter graves inconvenientes.

4º – Nenhuma pessoa deve desanimar com os azares da fortuna, antes deve esperar com  magnanimidade a volta da prosperidade, confiando em si mesmo, na Providencia, nos homens bons e generosos, e na perpetua mudança dos destinos humanos.

5º- Quem quizer conservar no mundo a sua independencia e quizer collocar se a nivel com individuos com quem tiver relações, não deve pedir-lhes cousa alguma, e não acceitar senão raras vezes os serviços que voluntariamente lhe quizerem prestar. Como porém, direis vós, prescindir sempre do apoio e da protecção dos outros? O meio é simples e  facil:  moderar os desejos e restringir as precisões.

“Almoço na Feira de Granada” (1887), Hugo Birger

6º – É necessario empenhar com lealdade a palavra, cumprir fielmente as promessas e dizer sempre a verdade. Nunca houve mentiras necessarias; as mais levem podem fazer-nos perder a confiança e a estima de nossos semelhantes.

7º – É necessário ser pontual, laborioso, minucioso mesmo no cumprimento dos deveres publicos. Convém adoptar ordem e arranjo nos proprios negocios e nos de outros que estiverem dependentes de nós. Toda a gente gosta de ter relações com um homem pontual e exacto.

8º – A arte de agradar na sociedade é saber adaptar o assumpto e a phrase da conversação á condição das pessoas com quem tratarmos, á sua capacidade e comprehensão, ao seu genio, caracter e posição social –  Observemos, diz Larochefoucauld em suas maximas, pesemos attentamente o lugar, a occasião e a disposição com que se achão as pessoas que nos escutão; porque se alguma vezes é preciso fallar, muitas convém calar. Ha certo silencio que serve de approvar e condemnar, bem como outro que é de discrição e respeito.

A conversação é um dos meios que temos  no nosso poder para obtermos estima e consideração  no mundo; mas para isso é necessario attender a duas cousas; que não fira nem fatigue. Ponha se cuidado escrupuloso em banir a maledicencia, a calumnia, as reticencias malignas e o escarneo, cousas que se assemelhão á espada de dous gumes que póde ferir o proprio que a empunha.

Desgraçadamente o ar satyrico e malevolo agrada ao commum das sociedades; entretanto cedo ou tarde torna desprezivel o individuo que trata de agradar á custa do credito e da reputação alheia.A zombaria permittida quando ella é temperada com critica espirituosa e galante, é aquella que, sem ofender os individuos, recahe sobre os desvios, o ridiculo, o excesso dos usos e das modas, dos vicios e máos costumes. E’ preciso desconfiar de daquelles que affectão querer encobrir todos os erros; ordinariamente são hypocritas que com o manto da caridade christãa procurão acreditar-se para cobrir os seus proprios ou para acreditarem o mal que elles disserem do proximo. Tudo tem meio termo: e sendo esse o verdadeiro systema do homem  do mundo, é uma fortuna sabê-lo seguir.

Engraçado pensar que, por mais distante que a Era Vitoriana seja do nosso cotidiano, existem algumas coisas que ainda fazem sentido, né? Esses princípios básicos de etiqueta são um ótimo exemplo!

Clique aqui para ler a primeira edição do “Novo Correio das Modas” (1854)

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Uma resposta

  1. Você é especial…. gostei de ler e ver o que está postando! Um trabalho bonito e diferenciado dos usos e costumes de uma época tão modernosa exageradamente moderna !

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